sexta-feira, 15 de maio de 2015

F1 - E com a palavra, Sir Jackie Stewart

Sir Jackie Stewart, tricampeão mundial de Fórmula 1 entre os anos 60 e 70, talvez o homem que mais lutou por segurança na Fórmula 1 em todos os tempos. Correu em apenas 99 corridas, quando estava por completar a centésima, chocado, desistiu de correr ao ver seu amigo e companheiro de equipe Françóis Cevert morrer nos treinos de classificação um dia antes da corrida histórica.
O escocês também já teve uma equipe na Fórmula 1, a StewartGP, no qual conquistou uma vitória com Johnny Herbert e que também teve Rubens Barrichello como piloto no final dos anos 90.
No final de semana do GP da Espanha, Sir Jackie deu uma entrevista para o Globoesporte.com, nela ele falou sobre a Fórmula 1 atual, sobre os pilotos de hoje, sobre os pilotos brasileiros do passado e do presente e muito mais, confira:

GloboEsporte.com: A F1 atual, dos motores híbridos, sem barulho, lhe agrada?

Jackie Stewart: Não. Pilotei pela última vez um carro de F-1, desses modernos, há dois anos, o modelo da Williams, em Goodwood. Eu não gostei. Claro, se eu o pilotasse de forma regular, acabaria por me adaptar a todos os seus recursos. Mas como não é o meu caso, tinha de entender todas aquelas funções instaladas no volante e depois enquanto pilotava estar atento ao pessoal da equipe me orientando sobre tudo pelo rádio. Vi que era muito fácil me distrair.
Jackie Stewart testando um carro da Williams
Entender as funções e interagir com elas considerei algo bastante difícil de fazer. Não fui ao limite. Nos carros do meu tempo, era como se você usasse os seus sapatos velhos, confortáveis. Você sabe onde está tudo, do que dispõe e não muda. Repito, pilotar esses carros de hoje é um imenso desafio. Não achei interessante. Gosto de pilotar carros rápidos, mas não com tanta coisa diferente para fazer enquanto piloto. Minha mente é mais simples. Faço o que preciso fazer. Hoje o piloto tem de entender o que se passa, analisar e tomar uma decisão. Eu não cresci nesse automobilismo. Não gosto dessa F-1, é muito complexa, prefiro quando era mais simples.

GE: Mudou o processo de seleção, um piloto inteligente, capaz de interagir com todos esse recursos, pode então se dar melhor que um apenas talentoso para acelerar?
JS: Não creio. O animal é o mesmo. A tecnologia muda, mas as pessoas são as mesmas. No meu tempo, você se adaptava à introdução dos pneus lisos (1971), à chegada da aerodinâmica (fim dos anos 60), com aqueles aerofólios altos, perigosos. Havia um choque inicial, mas nada dramático. Quando Fangio voltou a pilotar um carro da Mercedes e da Maserati mais moderno daqueles que o levaram a ser campeão, pilotou como antes. Os carros não haviam mudado tanto. Mesmo dos anos 50 para os 70. Hoje são muito diferentes, bizarros. Para encarar esse desafio com naturalidade o piloto tem de ser criado em outra cultura. Atualmente, já no kart existe telemetria.

GE: Se pudesse, o que mudaria na F1 atual?

JS: Mudaria o pacote de entretenimento. Os dirigentes da F-1 precisam melhorar seu show e ampliar o leque de opções para se divertir no autódromo. Em Bahrein, por exemplo, se você vai atrás das arquibancadas há de tudo, música, dança, circo, áreas de descanso para a família deitar, descansar. Pode comer de tudo, cardápio árabe, americano, indiano. A F-1 tem de pensar em atrair mulheres e crianças para o espetáculo. Veja o futebol. Hoje há quase tantas mulheres quantos homens. No passado, era um esporte de homens. O homem trabalha muitas horas por semana, chega em casa e diz a esposa que vai à partida de futebol. Ela passou a dizer que quer ir junto e levar os filhos, afinal pouco se veem. É o que está acontecendo. A F-1 ainda não pensou nisso. Espero que a nova geração de patrocinadores enxergue essa necessidade.

GE: A competição, em si, manteria como está?

JS: Não. Eu puniria os pilotos que saíssem da pista. Em Bahrein, na China, em todos os novos circuitos as áreas de escape são grandes e têm a mesma aderência da pista, é na realidade sua extensão. O piloto sai da pista e o tempo de volta é quase o mesmo. A tração fora é a mesma da pista. Não acho que tenhamos de voltar ao tempo de reduzir as áreas e provocar acidentes, mas a pista de corrida é aquela, o piloto não pode sair e nada acontecer. Se abusar dos limites da pista tem de haver punição.

GE: Sua convivência com o universo da F1 remonta a 1965, ano da estreia. Este ano lá se vão 50 anos acompanhando de perto o campeonato. Algum piloto dos que correm hoje o impressiona?

JS: Sim. Considero Alonso o de melhor cabeça. Hamilton o mais rápido. Mas comete erros. Nesta temporada estamos ainda na quinta etapa, mas espere, há tempo para errar. Será difícil para Rosberg vencer Lewis. Gosto dessa nova geração, Carlos Sainz Júnior, Max Verstappen, Daniel Ricciardo, me parecem fantásticos. Problema hoje é Mercedes ser tão superior na engenharia. Torna muito difícil ver, entender a capacidade dos pilotos. Honda vai chegar, japoneses são capazes, mas não vão ganhar corrida este ano.

GE: Apesar das dificuldades no GP da Espanha, a Ferrari deu um grande salto de 2014 para este ano. Ninguém esperava tanto, nem eles, como afirmam. Como vê?

JS: Não vivo intensamente o ambiente interno das equipes. Mas sei que James Allison, novo diretor técnico, é muito bom engenheiro, conversei com ele em algumas ocasiões. Seu pai costumava trabalhar comigo, oficial da Força Aérea, trabalhou na Jaguar. A Ferrari vai ganhar mais GP este ano.

GE: Nesses seus 50 anos de F-1 o senhor teve Emerson Fittipaldi como adversário, de 1970 a 1973, e viu depois pilotos brasileiros fenomenais, campeões do mundo, como Nelson Piquet e Ayrton Senna. Mas há muito o país não tem um representante nesse nível, como explicar?

JS: Rubens foi um grande piloto na F-1, seu recorde de longevidade não é ao acaso. Na Ferrari não lhe era permitido vencer, o time deu superpoder para Michael Schumacher. Rubens foi um piloto perfeitamente capaz de conquistar o título. Em qualquer esporte há períodos de dominação dessa ou daquela nação. Os finlandeses por muitos anos eram sempre os campeões no salto com esqui. Nas provas de descida de montanha com esqui, franceses e austríacos invariavelmente venciam. Então de repente chegaram os americanos, os alemães. A Grã-Bretanha também teve períodos sem campeões. Stirling Moss ganhou muitas corridas (anos 50), mas não o título. De James Hunt (1976) a Nigel Mansell (1992), os britânicos não foram campeões. E antes havíamos tido Graham Hill, Jim Clark e Jackie Stewart, também ficamos sem vencer o Mundial. Vejo como um fenômeno cíclico.
Com Fittipaldi e Peterson
GE: Em 1975, houve uma tragédia aqui em Barcelona, com a morte de cinco espectadores. A segurança da pista foi questionada por todos desde o primeiro momento. E quase não houve a corrida. Estava aqui?

JS: Sim, mas não no domingo, voltei para casa no sábado. Foi um choque percorrer a pista e ver os guardrails soltos. Parecia que estávamos num país no terceiro mundo, onde não dão muitas vezes atenção aos detalhes, não há controle, supervisão. Se parece que está bom já está ok. Lembro do que aconteceu aqui mesmo, em 1969, quando começamos a correr com aqueles aerofólios colocados a dois metros de altura, um perigo. O aerofólio se soltou nas duas Lotus, de Jochen Rindt e Graham Hill, e tivemos acidentes terríveis. Os guardrails também não suportaram o impacto, não estavam bem fixados. Alguém, da organização, tinha de verificar antes de a F-1 chegar se estava tudo está ok. A FIA só foi adotar esse procedimento depois de 1975, enviando um agente próprio.


GE: Bernie Ecclestone está perto de completar 85 anos de idade. Demonstrar sentir-se forte, lúcido ao extremo e mantém o controle da F1. Aliás desde o seu tempo de piloto, em 1972. Como será quando ele deixar a F1?

JS: Bernie fez mais para um esporte, no caso a F-1, mais do que qualquer outro cidadão a qualquer outro esporte. No futebol quem você diria que mudou o esporte? Ninguém. Na NFL (a liga de futebol norte-americano), o histórico Peter Rozelle deixou a entidade e ela até cresceu. Ninguém é indispensável. O próximo líder da F-1 talvez a torne ainda melhor. Bernie é fantástico. Olhe esse paddock, tudo certinho, perfeito. Financeiramente o que ele fez pela F-1 nem se fala. Sentirão falta de Bernie, mas será substituído.

GE: A Alemanha não tinha dinheiro para pagar os valores elevados cobrados por Ecclestone para promover o GP e a corrida não será disputada este ano. Acha correto esse radicalismo?

JS: Não pagaram porque quase ninguém iria para a corrida, falta de público. Ao contrário do DTM (Campeonato Alemão de Turismo), onde o autódromo está sempre lotado. Os ingressos da F-1 são muito caros, as pessoas não podem pagar hoje. Não há apelo para ir assistir à corrida. É o caso de resgatar aquilo que falei no começo da nossa conversa, é preciso melhorar o show e criar entretenimento para toda a família nas horas no autódromo.
Comemorando com Johnny Herbert e Rubens Barrichello a única vitória de sua equipe na F1, a StewartGP
GE: O Brasil tem atualmente na F1 Felipe Massa, na Williams, e Felipe Nasr, na Sauber. Como os vê?

JS: Nasr está demonstrando ser um piloto excepcional, ele me causa excelente impressão. Massa já foi vice-campeão, quase campeão, e ainda é muito eficiente, bastante útil para a Williams. Quando Emerson veio para a Europa, e com eles outros pilotos muito bons, como Pace (José Carlos Pace), eu achava que a razão era o feijão que vocês tanto gostam. Depois chegaram Piquet, Senna, Rubens, Massa, tantos, todos do mesmo país. Sei que havia naquela época muito mais apoio das empresas brasileiras para que os pilotos viessem a Europa do que na Grã-Bretanha e na França, por exemplo. Via brasileiros sempre lutando no nível máximo. Rubens veio para Europa, na F-Opel, F3, Senna também, todos tinham empresas brasileiras investindo. O espírito dos brasileiros casa muito bem com o do automobilismo. É algo que chama a atenção.

Rômulo Rodriguez Albarez - São Paulo/SP - ...

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